Fábio Murakawa*
Por exigência do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social), o governo da Bolívia e a construtora
brasileira OAS terão de elaborar um novo contrato para a execução da rodovia
que é pivô de um confronto entre o presidente Evo Morales e grupos indígenas.
A estrada foi projetada inicialmente para ter 306
km e foi dividida em três partes, sendo que o trecho 2, de 177 km, atravessaria
o Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (Tipnis). A obra, orçada
em US$ 415 milhões, contava com um financiamento de US$ 332 milhões do banco de
fomento brasileiro.
Mas, em outubro do ano passado, após uma marcha de
protesto de 61 dias que virou a opinião pública em favor dos índios, Morales
acabou assinando uma lei que proíbe qualquer rodovia de cruzar o Tipnis
.
No entender do BNDES, a nova legislação
inviabiliza a liberação do dinheiro, uma vez que o banco não pode financiar uma
obra que, em tese, está proibida por lei. A instituição agora aguarda que OAS e
a estatal Administração Boliviana de Carreteras (ABC) definam o novo escopo do
contrato para analisar de que forma pode apoiar a obra.
Um acordo entre a OAS e o governo boliviano não
será fácil, dada a turbulenta relação entre ambos. No final de 2011, segundo
fontes do governo brasileiro, a construtora chegou a paralisar as obras por
conta de falta de pagamento de serviços executados.
Agora, governo e empreiteira se desentendem em
torno do valor a ser cobrado pelos trechos 1 e 3 da rodovia, que o BNDES se
dispõe a financiar. Fontes próximas ao tema afirmam que o governo Morales
aceita pagar cerca de US$ 110 milhões. Já a OAS pede algo em torno de US$ 200
milhões.
“Ainda não temos os números porque ainda não
chegamos a um consenso com o governo boliviano”, disse ao Valor o
diretor-superintendente da área internacional da OAS, Augusto César Uzêda, sem
confirmar os valores.
Uzêda afirma que o governo boliviano está “em dia
com os pagamentos”, e as máquinas voltaram a funcionar no início deste ano –
segundo o diretor, o que paralisou a obra foi a indefinição quanto ao
financiamento do BNDES.
Uzêda disse ainda que a empresa aguarda uma definição
por parte da Bolívia sobre o que será feito em relação ao trecho 2. “Pode-se
chegar a um traçado alternativo, assim como existe a possibilidade de não
executar o trecho 2, por inviabilidade técnica e econômica.”
A lei de proteção ao Tipnis não encerrou a
controvérsia em torno da estrada na Bolívia. O veto, que Morales assinou a
contragosto e sob pressão, desagradou plantadores de coca, colonos agrícolas e
indígenas que vivem em Cochabamba, ao sul do parque, berço eleitoral do
presidente.
Apoiados pelos dois primeiros grupos, indígenas
filiados ao Conselho de Indígenas do Sul (Conisur) realizaram uma contramarcha
a favor da estrada. Chegaram a La Paz em meados de janeiro, mas sem o mesmo
apoio popular prestado à marcha da Confederação de Povos Indígenas da Bolívia
(Cidob), em 2011.
Enquanto muitos acusam o governo de estar por trás
da nova marcha, parlamentares ligados ao MAS – o partido de Morales – preparam
um projeto de lei para anular a legislação que o próprio presidente assinou no
ano passado. A ideia é fazer uma consulta popular sobre a realização ou não do
trecho 2 da estrada. O projeto pode ser votado nesta semana.
*Fonte: Valor Econômico