quinta-feira, 22 de maio de 2008

Altamira: Um relato de quem estava lá

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"O incidente aconteceu depois da explanação de Rezende [Paulo Fernando Vieira Souto Rezende], que defendeu a construção da usina: "Quero esclarecer aqui informações que foram faladas erroneamente pelo palestrante anterior", disse ele apontando Oswaldo Sevá, que momentos antes havia criticado duramente o projeto.

"Há 20 anos, o governo não levava em conta os índios e as questõesambientais, agora é diferente", explicou Rezende. Segundo ele, é preciso que os brasileiros deixem de ser egoístas. "Em 2017 haverá cerca de 204 milhões de pessoas. Todos têm que ter energia. Se a energia da região sudeste acabar, a gente manda a energia [gerada por Belo Monte]para lá", disse. Durante sua apresentação, o público, cerca de mil pessoas, vaiou duramente o representante do governo, que por isso elevou o tom de voz.Após sua fala, os índios se levantaram e começaram a cantar.

Os cerca de 600 índios presentes se aproximaram cantando e empunhando bordunas - espécie de porrete - e terçados - tipo de facão usado para abrir picadas na mata. Formou-se então uma roda de indígenas em torno de Rezende, que só conseguiu sair da área com a intervenção dos organizadores. Na confusão, o representante saiu ferido no braço direito e sem a camisa. Ele foi direto ao hospital da cidade, mas não corre risco de morte. Após sua saída, os índios continuaram a dançar e se manifestar.

O bispo do Xingu, Dom Erwin Krautler, que estava ao lado de Rezende nomomento que a confusão aconteceu, lamentou o incidente. "Levei um tremendo susto. Sangue derramado, seja de quem for, eu considero sempre uma tragédia", diz. Para Dom Erwin, que está em Altamira há mais de 30 anos e trabalha diretamente com os índios, a reação agressiva deles é resultado de várias experiências ruins com aproveitamentos hidrelétricos que afetam suas terras. "Os índios estão indignados e revoltados porque nunca foram consultados a respeito de hidrelétricas no Xingu", revela.

O procurador da República Felício Pontes Jr, responsável pela defesa dosdireitos indígenas no Pará, se mostrou preocupado: "estamos avisando oGoverno Federal há dez anos que haverá conflitos por causa da barragem no rio Xingu, já tentamos convencer as autoridades a consultar os povosindígenas e o triste episódio de hoje mostra que eles estão dispostos aresistir até fisicamente para que não seja feito o barramento".

Para nós, movimentos que compõem a Via Campesina, que estão presentes no ato, essa ação é o ápice de um descaso para com todo o povo brasileiro e em especial, do povo da Amazônia, que sofre todas as violências possíveis no seu dia a dia, e vê o próprio estado, defender a impunidade, como foi o caso da missionária Dorothy Stang.

Não defendemos a violência, porém, esse fato demonstra a inquietação do povo e a rebeldia entalada na garganta, após todos esses anos de descaso por parte de quem governa, e quer a duras penas, implementar grandes projetos, com fins de desenvolver a Amazônia, mas que ao contrário, enriquece uns as custas de milhares de pessoas.”

Rogério - MAB
Fonte: Coordenação Nacional da FEAB, por e-mail.
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