Por Helton Lucinda Ribeiro*
Uma das primeiras
iniciativas do governo Lula em 2003 foi enviar ao Congresso Nacional a Proposta
de Emenda Constitucional número 40 (PEC 40), que promovia nova reforma da
Previdência Social. A proposta do governo surpreendeu setores da sociedade que
esperavam, sim, por reformas, mas não para retirar direitos dos trabalhadores.
Com sua aprovação e promulgação da Emenda Constitucional 41, foram instituídas,
entre outras coisas, a cobrança de contribuição dos aposentados e pensionistas,
o fim da aposentadoria integral no serviço público e o fim da paridade entre
ativos e aposentados.
Lula empenhou todo o seu
prestígio político para garantir a aprovação da PEC 40. Inclusive convencendo o
então presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), João Felício, a
desistir de se candidatar à reeleição. Isso porque Felício era professor do
ensino público e sua base poderia pressioná-lo a se opor firmemente à reforma.
Quem se elegeu foi Luiz Marinho, oriundo do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC,
o mesmo sindicato autor da recente proposta de Acordo Coletivo Especial (ACE),
que flexibiliza a CLT ao fazer o “acordado prevalecer sobre o legislado”.
Marinho foi premiado posteriormente com o cargo de ministro do Trabalho e
depois da própria Previdência Social.
Até então, porém, a Reforma
da Previdência era entendida como uma traição a princípios elementares da
esquerda. Representava a adoção da agenda conservadora na medida em que buscava
desvincular direitos sociais da arrecadação tributária. A mesma política
continua sendo posta em prática, por exemplo, com as atuais desonerações
fiscais que incidem sobre tributos destinados à Seguridade Social, como PIS e
Cofins. Com isso, o governo deve deixar de arrecadar R$ 16 bilhões neste ano e
R$ 19 bilhões em 2014.
Na prática, esse tipo de
renúncia fiscal configura uma transferência de renda às avessas, beneficiando a
iniciativa privada em detrimento das aposentadorias dos trabalhadores, sem
ganhos comprovados para a sociedade. Já o Regime Geral de Previdência Social é
o maior programa de distribuição de renda do país. Foi responsável por tirar 24
milhões de brasileiros da pobreza só em 2011, segundo dados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).
A reforma de 2003 também foi
sustentada perante a opinião pública com base em argumentos falaciosos, como o
do suposto déficit da Previdência. Trata-se de um mito. O governo, na verdade,
desvia recursos da Seguridade Social para outras finalidades, como o pagamento
dos juros da dívida pública. De acordo com estudos da Associação Nacional dos
Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), o sistema previdenciário – que é
apenas uma das partes da Seguridade Social, junto com a Saúde e a Assistência
Social – é superavitário, apresentou um saldo positivo de R$ 77 bilhões em 2011
e R$ 58 bilhões em 2010. Nada justifica, portanto, as reformas feitas por FHC e
Lula.
Mas, agora, descobre-se algo
mais sobre a Reforma da Previdência de 2003, completamente desmoralizante para
a democracia brasileira: ela foi literalmente comprada no esquema que se tornou
conhecido como “mensalão”. A esta conclusão chegou o Supremo Tribunal Federal
(STF), no julgamento da Ação Penal 470, ao constatar a existência de corruptor
– o Executivo – e corrompidos – deputados do PT, PDT, PL, PMDB e PP – no
processo de votação da reforma. Pois bem, o objeto da corrupção foi a PEC 40.
Em razão disso, diversos
setores do movimento sindical lançaram a Campanha pela Anulação da Reforma da
Previdência. A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação
Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) já ingressaram com
ação no STF alegando “vício de inconstitucionalidade formal”, uma vez que a
aprovação da PEC 40 “decorreu de ato criminoso (corrupção) perpetrado por
integrantes do Poder Executivo em face de membros do Poder Legislativo, sem o
qual não teria sido possível aprovar a Reforma da Previdência número 2”,
segundo afirma, na ação, o advogado Alberto Pavie Ribeiro.
Neste dia 24 de abril,
trabalhadores de diversas categorias, de todas as regiões do país, estarão em
Brasília, realizando um grande ato pela anulação da Reforma da Previdência. É
preciso reconhecer que a reforma é produto de uma fraude e, portanto, deve ser
considerada nula. E lutar também contra a reforma feita por FHC, que instituiu
o “fator previdenciário”, responsável por reduções de até 40% no valor das
aposentadorias, e contra a nova reforma ensaiada pelo governo Dilma Rousseff,
que planeja substituir o fator previdencário pelo ainda mais perverso fator
95/105. Afinal, se o sistema é superavitário, é perfeitamente
sustentável, sem a necessidade de que os trabalhadores arquem com o ônus da
gestão irresponsável e fraudulenta da Seguridade Social.
*Jornalista e diretor da
Secretaria de Imprensa do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público
Federal do Estado de São Paulo (SINDSEF-SP)