Antes de qualquer ato de licenciamento deve ser feita a consulta com as populações afetadas, dizem procuradores
O Ministério Público Federal (MPF) entrou nesta quarta-feira, 3 de abril, com recurso para suspender a operação militar que o governo federal faz na região do Tapajós, no oeste do Pará, assim como os estudos e o licenciamento da usina hidrelétrica São Luiz do Tapajós. O MPF pede que, antes de qualquer ato de licenciamento ou estudos, os índios Munduruku e as comunidades ribeirinhas diretamente afetados sejam consultados, conforme manda a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
“Considerando que a política energética atual do Estado brasileiro para a Amazônia compreende a produção de energia a partir do barramento dos rios, o direito à consulta, conforme estabelecido na Convenção 169, merece destaque. Trata-se de condição essencial para a segurança das comunidades e para o livre exercício dos direitos humanos e fundamentais dos povos afetados, cujo modo de vida inerente ao rio passa a ser ameaçado”, diz o recurso do MPF.
O recurso foi apresentado à Justiça Federal em Santarém, mas deve ser apreciado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. A Convenção 169 foi assinada pelo Brasil em 2002 e integrada ao ordenamento jurídico brasileiro em 2003. De acordo com decisões do Supremo Tribunal Federal, tem força de emenda constitucional. Mas nunca foi aplicada pelo governo brasileiro, apesar dos inúmeros projetos hidrelétricos que afetam populações tradicionais na Amazônia.
Para os procuradores da República que atuam no caso, a operação armada que está ocorrendo atualmente no Tapajós derruba qualquer chance de diálogo e consulta como manda a Convenção 169. “Não existe diálogo, mas predisposição ao confronto. O Judiciário deve afirmar peremptoriamente se entende a Operação Tapajós como processo adequado de diálogo, pautado pela boa-fé, conforme prescreve a Convenção 169 da OIT. Na visão do MPF, está claro que a Operação descumpre a Convenção, ferindo os mais comezinhos princípios de direitos humanos”, dizem os procuradores Fernando Antônio de Oliveira Jr, Felipe Bogado e Luiz Antonio Amorim Silva, de Santarém.
No recurso, o MPF pede a reconsideração das decisões anteriores da Justiça Federal de Santarém. O juiz Airton Aguiar Portela permitiu a continuidade da chamada Operação Tapajós, apesar de ter ordenado a consulta aos indígenas e a realização da avaliação ambiental integrada da bacia do Tapajós. O MPF quer a revisão desse entendimento, para suspender todo e qualquer ato para licenciamento de usinas, inclusive a operação militar, enquanto não houver a consulta.
O Tribunal também vai analisar o pedido para que todas as populações tradicionais da região onde o governo quer construir as usinas sejam consultadas, não apenas os indígenas. Os ribeirinhos do alto e médio Tapajós são conhecidos como beiradeiros e vivem em uma das regiões ambientalmente mais bem preservadas de toda a Amazônia. O processo de consulta previsto na Convenção 169 inclui a identificação de todas as comunidades tradicionais afetadas.
O governo alegou no processo judicial sobre a usina São Luiz do Tapajós que só pode fazer a avaliação ambiental do impacto de várias usinas se fizer estudos na região. Com isso, justificou a operação militar que está atualmente em curso na região e que, no entendimento do MPF, pode ocasionar graves conflitos com as comunidades indígenas. Para o MPF, a consulta deve preceder qualquer tipo de estudo ambiental na região.
“A realização de avaliação ambiental antes do processo de consulta ofende à Convenção 169 da OIT, porquanto a consulta aos povos indígenas e às população tradicionais deve ser prévia”, diz o recurso. “O Governo Federal, ao tentar realizar de maneira precipitada o processo de consulta, no cenário de potencial conflito como o atual, descumpre a Convenção 169 da OIT e sujeita o Estado brasileiro a sanções na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)”, alertam.
A Convenção 169 da OIT determina a consulta sempre que seja prevista qualquer medida legislativa ou administrativa que possa afetar diretamente populações indígenas e tradicionais. “Verifica-se que existem inúmeras medidas legislativas e administrativas tomadas por órgãos, agentes públicos do poder executivo e legislativo, bem como pelo empreendedor, com a autorização do executivo. Todas elas afetam diretamente os povos indígenas cujas terras estão ameaçadas pela sobreposição da UHE São Luiz do Tapajós. No entanto, não houve a consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas e tradicionais afetados pelas medidas e pelas ações do projeto”, explica o recurso do MPF.
Carta Munduruku
Na manhã desta quinta-feira, 4 de abril, o MPF recebeu em Belém uma liderança dos índios Munduruku, Valdenir Munduruku, representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Luís Claúdio Teixeira, representante do Fórum da Amazônia Oriental (FAOR), Marquinho Mota, e outros integrantes de organizações que atuam em defesa dos direitos indígenas. O grupo entregou ao procurador da República Ubiratan Cazetta uma carta em que reforçam a necessidade de interrupção urgente da operação Tapajós.
"O governo está em nossas terras como bandidos, como ladrões invadindo sem avisar os nossos rios e territórios para destruir o rio Tapajós e explorar nossas riquezas. E está ameaçando nos ferir ou matar se reagirmos", diz o texto. O documento será encaminhado à Procuradoria da República em Santarém.
Veja a versão digitalizada da carta Munduruku aqui.
Fonte: MPF
“Considerando que a política energética atual do Estado brasileiro para a Amazônia compreende a produção de energia a partir do barramento dos rios, o direito à consulta, conforme estabelecido na Convenção 169, merece destaque. Trata-se de condição essencial para a segurança das comunidades e para o livre exercício dos direitos humanos e fundamentais dos povos afetados, cujo modo de vida inerente ao rio passa a ser ameaçado”, diz o recurso do MPF.
O recurso foi apresentado à Justiça Federal em Santarém, mas deve ser apreciado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. A Convenção 169 foi assinada pelo Brasil em 2002 e integrada ao ordenamento jurídico brasileiro em 2003. De acordo com decisões do Supremo Tribunal Federal, tem força de emenda constitucional. Mas nunca foi aplicada pelo governo brasileiro, apesar dos inúmeros projetos hidrelétricos que afetam populações tradicionais na Amazônia.
Para os procuradores da República que atuam no caso, a operação armada que está ocorrendo atualmente no Tapajós derruba qualquer chance de diálogo e consulta como manda a Convenção 169. “Não existe diálogo, mas predisposição ao confronto. O Judiciário deve afirmar peremptoriamente se entende a Operação Tapajós como processo adequado de diálogo, pautado pela boa-fé, conforme prescreve a Convenção 169 da OIT. Na visão do MPF, está claro que a Operação descumpre a Convenção, ferindo os mais comezinhos princípios de direitos humanos”, dizem os procuradores Fernando Antônio de Oliveira Jr, Felipe Bogado e Luiz Antonio Amorim Silva, de Santarém.
No recurso, o MPF pede a reconsideração das decisões anteriores da Justiça Federal de Santarém. O juiz Airton Aguiar Portela permitiu a continuidade da chamada Operação Tapajós, apesar de ter ordenado a consulta aos indígenas e a realização da avaliação ambiental integrada da bacia do Tapajós. O MPF quer a revisão desse entendimento, para suspender todo e qualquer ato para licenciamento de usinas, inclusive a operação militar, enquanto não houver a consulta.
O Tribunal também vai analisar o pedido para que todas as populações tradicionais da região onde o governo quer construir as usinas sejam consultadas, não apenas os indígenas. Os ribeirinhos do alto e médio Tapajós são conhecidos como beiradeiros e vivem em uma das regiões ambientalmente mais bem preservadas de toda a Amazônia. O processo de consulta previsto na Convenção 169 inclui a identificação de todas as comunidades tradicionais afetadas.
O governo alegou no processo judicial sobre a usina São Luiz do Tapajós que só pode fazer a avaliação ambiental do impacto de várias usinas se fizer estudos na região. Com isso, justificou a operação militar que está atualmente em curso na região e que, no entendimento do MPF, pode ocasionar graves conflitos com as comunidades indígenas. Para o MPF, a consulta deve preceder qualquer tipo de estudo ambiental na região.
“A realização de avaliação ambiental antes do processo de consulta ofende à Convenção 169 da OIT, porquanto a consulta aos povos indígenas e às população tradicionais deve ser prévia”, diz o recurso. “O Governo Federal, ao tentar realizar de maneira precipitada o processo de consulta, no cenário de potencial conflito como o atual, descumpre a Convenção 169 da OIT e sujeita o Estado brasileiro a sanções na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)”, alertam.
A Convenção 169 da OIT determina a consulta sempre que seja prevista qualquer medida legislativa ou administrativa que possa afetar diretamente populações indígenas e tradicionais. “Verifica-se que existem inúmeras medidas legislativas e administrativas tomadas por órgãos, agentes públicos do poder executivo e legislativo, bem como pelo empreendedor, com a autorização do executivo. Todas elas afetam diretamente os povos indígenas cujas terras estão ameaçadas pela sobreposição da UHE São Luiz do Tapajós. No entanto, não houve a consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas e tradicionais afetados pelas medidas e pelas ações do projeto”, explica o recurso do MPF.
Carta Munduruku
Na manhã desta quinta-feira, 4 de abril, o MPF recebeu em Belém uma liderança dos índios Munduruku, Valdenir Munduruku, representante do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Luís Claúdio Teixeira, representante do Fórum da Amazônia Oriental (FAOR), Marquinho Mota, e outros integrantes de organizações que atuam em defesa dos direitos indígenas. O grupo entregou ao procurador da República Ubiratan Cazetta uma carta em que reforçam a necessidade de interrupção urgente da operação Tapajós.
"O governo está em nossas terras como bandidos, como ladrões invadindo sem avisar os nossos rios e territórios para destruir o rio Tapajós e explorar nossas riquezas. E está ameaçando nos ferir ou matar se reagirmos", diz o texto. O documento será encaminhado à Procuradoria da República em Santarém.
Veja a versão digitalizada da carta Munduruku aqui.
Fonte: MPF