Como parte das atividades da
Semana dos Povos Indígenas que reúne lideranças de todo o país em Brasília,
foram realizadas na terça-feira (16 de abril) várias atividades no Congresso
Nacional onde tramita a Projeto de Emenda Constitucional n° 215 que pretende
retirar do Executivo a atribuição de delimitação e demarcação de terras
indígenas, transferindo-as ao próprio Congresso. Na última quarta-feira (11), foi aprovada a instalação
de uma comissão especial para tratar desta PEC.
Os indígenas participaram da
reunião da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas
e, em seguida afirmaram que só deixariam o Congresso depois de o presidente da
Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), assumir o compromisso de cancelar a
PEC 215. “Se o presidente não vier, nós vamos dormir aqui”, diziam as
lideranças.
O líder do povo Truká,
Neguinho Truká, de Pernambuco, cobrou a revogação imediata da instalação da comissão
especial. “Ou o senhor revoga isto hoje ou nós não desocupamos aqui. Nós iremos
permanecer. Se é promessa em campanha do senhor, então prometa a nós também”,
disse, em referência ao acordo feito pelo presidente na semana passada para
instalar a PEC 215/00. A crítica das lideranças indígenas é de que Henrique
Eduardo Alves teria feito promessa de campanha para atender a interesses da
bancada ruralista, como a PEC 215/00. O presidente da Câmara rebateu. “Não há
bancada nenhuma na casa que imponha nenhuma de suas vontades”, disse. Segundo
ele, as bancadas podem apenas expor suas ideias na Câmara.
A pressão teve efeito. O presidente da Câmara,
Henrique Eduardo Alves, anunciou a suspensão temporária da escolha dos membros
da comissão especial destinada a analisar a proposta de Emenda. “Vou falar com
os líderes (partidários) para não indicar os representantes até que tenhamos o
entendimento”, disse.
Após a fala de Alves, os
indígenas resolveram esperar até a reunião dos líderes partidários. Mais de 700 lideranças indígenas de diferentes etnias lotavam
o plenário da Comissão de Constituição e Justiça e tomavam conta de corredores do Congresso.
Enquanto isso,
um grupo indígena conseguia adentrar no plenário da Câmara, onde ocorria uma sessão.
A entrada no local foi precedida de pancadaria por parte de seguranças. A ocupação
durou apenas 50 minutos, mas inicialmente gerou pânico entre parlamentares, que saíram
em correria pelos corredores do Congresso.
Apesar da fala de Alves sobre respeito
e democracia, no sentido de convencer os índios a desocuparem o plenário, o que
se viu, na realidade, foi uma postura bastante truculenta da Polícia Legislativa.
Para tentar conter a ocupação, os policiais apelaram para a utilização do
choque elétrico. O Secretário Executivo do Cimi, Cleber Buzatto, foi uma das
vítimas desse tratamento “democrático e respeitoso”. O editor do jornal
Porantim, também do Cimi, Renato Santana, que fotografava a manifestação, foi
espancado por vários policiais, teve seus óculos destruídos e foi arrastado
para dentro do café do plenário. Sendo solto somente graças à intervenção do
deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ). Ambos apresentaram denúncia na delegacia da
Polícia Legislativa da Câmara e fizeram exame de corpo delito no Instituto
Médico Legal (IML). Vários índios também relataram ter sofrido agressões por
parte dos seguranças da Câmara.
Em assembleia realizada por volta das 21h, no auditório da Comissão de Constituição e Justiça, os indígenas decidiram aceitar a proposta apresentada pela comissão de parlamentares e desocuparam a Câmara. A decisão foi tomada após a reunião de dez lideranças indígenas com o presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB/RN), que contou com a presença de outros parlamentares que asseguraram que haverá qualquer movimentação dos congressistas em relação à PEC 215. Uma mesa de negociação deverá ser instalada ainda hoje para discutir todas as proposições legislativas e algumas executivas que ameaçam direitos indígenas. Segundo a proposta, este grupo de negociação será paritário, ou seja, terá em sua formação o mesmo número de parlamentares (de diferenças legendas, inclusive as vinculadas aos ruralistas) e de lideranças indígenas.
Em assembleia realizada agora pela manhã, 17 de abril, em Luziânia, os indígenas fizeram uma avaliação da ocupação e dos atos durante o dia de ontem. “A avaliação foi bastante positiva. E a proposta feita pelos parlamentares foi considerada um passo importante no sentido de garantir os direitos indígenas. Precisamos agora saber quais as condições práticas sobre, por exemplo, a paridade, o número de participantes dessa mesa e quem banca a vinda das lideranças indígenas para Brasília, de modo que a conversação realmente aconteça”, afirma Saulo Feitosa, Secretário Adjunto do Cimi.
*Com informações da Agência
Câmara e Conselho Indigenista Missionário (CIMI)