Gravações telefônicas feitas pela
Polícia Federal revelam que o grupo do empresário Carlos Cachoeira, denunciado
por suspeita de comandar um esquema de exploração de jogos ilegais, negociou
propina no Incra com o objetivo de regularizar uma fazenda.
Segundo relatório da PF da Operação
Monte Carlo, datado de novembro passado, "são veementes os indícios da
corrupção de servidores públicos em troca das liberações e assinaturas
necessárias para regularização da área".
O relatório menciona valores e diz
haver envolvimento do superintendente do Incra (Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária) no Distrito Federal, Marco Aurélio Bezerra da
Rocha, com o grupo de Cachoeira.
Segundo a polícia, foram pagos R$ 200
mil de propina para liberação do registro da fazenda, chamada Gama, nos
arredores de Brasília, em abril do ano passado.
As gravações indicam que Cachoeira e o
empresário Cláudio Abreu, um ex-diretor da Delta Construção e suspeito de
integrar a quadrilha, compraram em dezembro de 2010 35% da fazenda -cerca de
4.000 hectares- por R$ 2 milhões.
O preço, considerado pela PF como
abaixo do cobrado no mercado, é explicado pelo terreno estar em situação
irregular, diz a polícia.
O objetivo da compra seria obter lucro
com a revenda após a regularização - o que, na investigação, não fica claro se
de fato ocorreu.
A PF afirma que o dinheiro veio de uma
empresa usada pelo grupo de Cachoeira para lavagem de dinheiro.
"O valor pago pelo grupo é
irrisório acaso a área venha ser registrada e regularizada", diz a PF, ao
relatar o potencial de lucro do negócio.
"O motivo de negociar parte da
área por valor tão baixo assenta-se no fato de 'quem' são as pessoas dos
compradores e o que elas podem fazer para viabilizar a regularização da
referida fazenda", completa a PF.
A regularização, dizem os
investigadores, dependia de um registro do Incra chamado georreferenciamento
-uma espécie de descrição do imóvel, com características e limites.
Depois das negociações, diz a polícia,
o georreferenciamento foi feito em oito dias e emitido no dia 19 de abril de
2011 com a participação do dirigente do Incra no DF.
A apuração para aí, não avançando
sobre o que ocorreu com o terreno depois.
Numa gravação telefônica do dia 25 de
abril, Gleyb Cruz, braço direito de Cachoeira, disse que já havia informado o
empresário do compromisso que teria sido assumido pelo superintendente do
Incra.
"A gente tá com uma pessoa que pode estar alinhada, de peso (...), que é
o superintendente do Incra", afirmou Cruz em ligação gravada com
autorização judicial. "Tal pessoa foi identificada como Marco Aurélio
Bezerra Rocha", registra a polícia.
De acordo com a investigação, houve
até um calote durante as negociações.
"Era para [servidores do Incra] ter recebido 200, recebeu 80 só. Não, 80
não, 75. Porque teve que dar mais 5 para outro fazer um serviço não sei como é
que é. Ficou com 75, de 200 ficou com 75 e o cabra [intermediário que fez o
pagamento] não atende o telefone dele mais", afirmou um interlocutor
identificado pela PF como "Baltazar", um dos vendedores da terra.
A polícia afirmou em seu relatório que
"200" seriam provavelmente R$ 200 mil.
Superintendente nega relação com empresário
O superintendente do Incra
no Distrito Federal, Marco Aurélio Bezerra da Rocha, negou ter mantido relações
com o grupo do empresário Carlinhos Cachoeira.
Ele afirmou que pretende solicitar a abertura de uma sindicância
no órgão para apurar o caso.
Rocha disse que nunca teve reuniões com as pessoas citadas pela
Polícia Federal nos relatórios da Operação Monte Carlo.
"Eles nunca foram atendidos no meu gabinete", afirmou
Rocha.
Segundo ele, "o Incra
vai tomar todas as providências para investigar isso."
O superintendente reconheceu que o registro foi concedido pelo Incra, mas afirmou que ele poderá ser
cancelado.
Antes disso, ele promete fazer uma vistoria "in loco" na
área da Fazenda Gama para analisar se a documentação da área foi liberada de
forma regular.
Rocha argumentou também que seu nome pode ter sido usado por
terceiros dentro da estrutura do Incra.
"Alguém pode ter vendido facilidades", afirmou.
Fonte: Folha