No ano passado, foram 32
líderes locais assassinados
Gustavo Uribe*
A tensão causada pela
disputa por terras tem se agravado e elevado o número de mortos em conflitos
agrários no Brasil. No ano passado, o total de líderes locais assassinados,
entre sem-terra, indígenas e pescadores, cresceu 10,3% em relação a 2011,
subindo de 29 para 32. As mortes aconteceram, em sua maioria, no Pará e em
Rondônia, estados onde os conflitos por terras e as disputas em torno da
exploração ilegal de madeira têm recrudescido nos últimos anos. Os dados da
Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostram que o Rio de Janeiro, onde a média de
mortes era de uma por ano, contabilizou quatro no ano passado, maior patamar
desde 1999, quando foram assassinadas cinco pessoas. No país, de 2000 a 2012, a
violência causada por conflitos agrários provocou 458 mortes.
Uma das últimas vítimas
foi um dos dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) em Campos
dos Goytacazes (RJ), Cícero Guedes dos Santos, de 49 anos, assassinado com dez
tiros, em janeiro, em uma estrada de terra do município. A Polícia Civil apura
o envolvimento no crime de um homem que pretendia assumir a liderança de um
assentamento na Usina Cambahyba, invadida em 2012. Em fevereiro, 11 dias após a
morte do sem-terra, o corpo da produtora rural Regina dos Santos Pinha, de 56
anos, foi encontrado no assentamento Zumbi dos Palmares, também em Campos dos
Goytacazes (RJ).
— Na Usina Cambahyba, o
mandante do assassinato foi identificado e, segundo as investigações, é um
ex-empregado da fazenda que queria exercer influência no acampamento dos
trabalhadores. Como sua influência não foi aceita, ele acabou matando o
dirigente. Em relação à outra morte, ainda não foi identificada a motivação do
assassinato, explicou o ouvidor agrário nacional do Ministério do
Desenvolvimento Agrário, desembargador Gercino José da Silva Filho.
Em novembro ocorreu o
maior número de mortes no campo em 2012. Ao todo, sete pessoas foram
assassinadas, quase metade delas no Pará. O estado, que costuma registrar o
maior número de mortes em conflitos no campo, apresentou queda no total de
assassinatos: de 12, em 2011, para 6, em 2012. Em Rondônia, por sua vez, a
violência aumentou: de 2, em 2011, para 7, em 2012. O aumento deveu-se sobretudo
à disputa entre madeireiros na área de divisa do estado com o Acre e o
Amazonas, região que tem sido palco de episódios de violência nos últimos anos.
O avanço recente da ocupação de terras no local também é apontado como fator
responsável pela grande incidência de conflitos.
— Os conflitos continuam
e a violência aumenta não tanto pela ação estatal, como se via há muito tempo,
mas agora pela iniciativa privada de pistoleiros, jagunços e até de empresas
contratadas para fazerem esse tipo de violência — observou Isolete Wichinieski,
da coordenação nacional da CPT.
Ano passado, conflitos
em áreas indígenas deixaram sete mortos, a maioria no Maranhão. Em Mato Grosso
do Sul, em fevereiro deste ano, um índio guarani-caiová, de 15 anos, foi morto
na cidade de Caarapó, crime que teve repercussão internacional. Denilson
Barbosa foi assassinado pelo fazendeiro Orlando Gonçalves Carneiro, que
confessou o crime um dia após o assassinato. Na última quinta-feira, a família
da vítima foi incluída no Programa de Proteção a Testemunhas, que, em 2011,
quintuplicou o total de protegidos no campo.
Atualmente, segundo a
Secretaria de Direitos Humanos, 391 pessoas estão incluídas no Programa de
Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos. Os dados da CPT mostram que o
número de pessoas “marcadas para morrer” no meio rural em 2012 foi menor que em
2011, mas permaneceu em nível elevado. O total de pessoas ameaçadas de morte
passou de 347, em 2011, para 280, em 2012, o segundo maior patamar desde 2006.
No Norte, os próprios integrantes da CPT têm sofrido ameaças e perseguições de
pessoas que exploram ilegalmente a madeira da região.
O tráfico de madeira
vitimou, no ano passado, duas pessoas em Rondônia. Na frente do filho, de 5
anos, a extrativista Dinhana Nink, de 28 anos, foi assassinada após ter
denunciado um grupo de grileiros que extraía madeira ilegalmente na região.
Outra vítima foi o índio João Oliveira da Silva Kaxarari, assassinado em agosto
por traficantes de maneira que invadiram uma propriedade indígena, na fronteira
entre Rondônia e Amazonas.
*Fonte: O Globo