Entre as poucas famílias
assentadas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) no
ano de 2012, José Rodrigues Moreira e Antônia Nery de Souza teriam sido
contemplados com um lote no Projeto de Assentamento Agroextrativista Praia
Alta-Pirambeira, em Nova Ipixuna, Sudeste do Pará.
O discurso governamental de
que a considerável queda no número de famílias beneficiadas pelo Programa
Nacional de Reforma Agrária se deve a uma maior ênfase na qualificação dos
assentamentos se desfez mais uma vez no ar com este ilustrativo exemplo.
Antônio Rodrigues Moreira,
preso, é acusado de ser o suposto mandante do assassinato do casal de
extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo Silva ,
em maio de 2011. Ele e sua cônjuge teriam sido homologados como assentados pelo
Incra em 14 de dezembro de 2012, no mesmo assentamento onde o casal foi
assassinado, exatamente por denunciar a compra e venda de terras dentro do
projeto, inclusive a terra do lote onde os “novos assentados agroextrativistas
da reforma agrária de qualidade do governo federal” foram homologados. A compra e venda de lotes por si só já seria um impedimento ao casal de acessar o programa de reforma agrária
O inquérito aponta que
Moreira queria ocupar uma área comprada ilegalmente por 100 mil reais, em 2010. O fazendeiro pretendia criar gado no local, mas não conseguiu expulsar três
famílias que viviam no lote sob a proteção de José Cláudio e Maria. Por isso, teria
ordenado a morte do casal. Depois, teria deslocado parentes para ocupar os
lotes e registrá-los no Incra. Um movimento que foi denunciado pela Federação
dos Trabalhadores na Agricultura, pela Comissão Pastoral da Terra e pelo
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Ipixuna, em carta de 21 de maio de
2012. As entidades ainda alertaram que pessoas ligadas ao acusado
mantinham ameaças a quem tentasse retomar no assentamento o trabalho de José
Cláudio e Maria.
“Nós protocolamos um
documento no Incra em
maio de 2012, porque tivemos notícias que Incra estava tentando assentar ele em
outro lote. Assentar seria premiar o mandante após ele executar figuras
importantes na região”, afirma o advogado da CPT em Marabá, Jose Batista
Afonso, que é assistente de acusação no processo que apura a morte do casal.
Apesar de Relação de
Beneficiários homologada pelo próprio órgão fundiário apontar que o casal foi
assentado, o Incra disse que o processo administrativo de
assentamento não está concluído e por isso o casal não poderia ser reconhecido
oficialmente como beneficiário do Programa de Reforma Agrária. “Um dos
critérios para a concessão do título de reforma agrária é análise dos
documentos do casal, sendo que o fato de um dos dois seja a (o) titular ou o
(a) cônjuge ter algum impedimento legal, o benefício não é concedido”, afirma a
nota emitida pelo Incra.
Em outras palavras, o Incra
afirma que homologou o casal como assentado, para depois, quem sabe um dia,
verificar se um deles (ou os dois) possuíam algum impedimento legal para tal.
Curiosamente, o órgão fundiário se limita a afirmar que apenas a mulher do
acusado é “requerente” do assentamento, esquecendo-se que seu marido preso
também foi homologado, conforme documento abaixo:
“Embora a Sra. Antonia Nery,
na condição de titular requerente da regularização, não esteja arrolada no
processo criminal citado na matéria, a Superintendência Regional do Incra de
Marabá identificou a situação de impedimento do cônjuge, Sr. José Rodrigues
Moreira. A partir dessa identificação, no dia 20 de fevereiro de 2013
encaminhou o processo administrativo à Procuradoria Federal Especializada para
ajuizamento de ação judicial visando a retomada do imóvel ocupado pela Sra.
Antonia Nery”, afirma o Incra em outro trecho da nota enviada a imprensa. Ou
seja, apesar de afirmar que a “requerente” não está assentada, o Incra
precisará entrar com uma ação judicial para retirá-la do lote que ocupa e onde
foi assentada.
Enquanto isso, irmã de
liderança assassinada vive sob ameaça
Há quase dois anos, Laisa
dos Santos Sampaio convive com a tensão criada pelas sucessivas ameaças de
morte. Laisa é irmã de Maria do Espírito Santo e cunhada de José Cláudio. Ela não esconde a tristeza com a decisão do Incra em conceder à esposa de José
Rodrigues Moreira, acusado de ser o mandante do assassinato do casal, a posse
do lote no assentamento que levou ao conflito e à morte dos ambientalistas.
Entre eles, Laisa e sua
família. “O que mais dói é saber que essas pessoas foram protegidas pelo órgão
competente pela lei. É muito triste perceber a conivência com o mal”, lamenta.
Conforme o julgamento,
marcado para 3 de abril, se aproxima, o clima fica mais tenso. As pessoas, diz
Laisa, a avisam dos riscos que corre. Com medo, evita comentar o caso para não
sofrer retaliações. “Corro o risco de perder meu trabalho.”
*Com algumas informações do
G1 e Carta Capital
Observação: Esta foi a 6.000° postagem deste blog.
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