Lideranças de 26
comunidades mebengôkre/kayapó das terras indígenas Kayapó, Badjonkôre,
Menkragnoti e Las Casas, no Pará, se reuniram nos dias 4 e 5 de março na cidade
de Tucumã para discutir sobre as ofertas de recursos da Eletrobrás para o povo
kayapó.
A luta do povo kayapó contra Belo Monte representa historicamente
um dos maiores obstáculos à construção da usina. Entretanto, por estarem suas
terras a 500 km a montante da usina, os kayapo não foram incluídos no Plano
Basico Ambiental para mitigação de impactos da obra.
Se concluída, Belo Monte, que já é a obra mais cara do país
(estimada em R$ 31 bilhões), precisará de novos barramentos à montante para
justificar tamanho investimento, garantindo água a suas turbinas durante a
estação seca. Entretanto, sempre que questionados pelos kayapó sobre os planos
do governo de barramentos planejados para o Xingu, representantes do setor
elétrico se ampararam na frágil resolução de no 05 do Conselho Nacional de Política
Energética de 03 de setembro de 2009, que determina que o potencial
hidroenergético a ser explorado no rio Xingu será somente aquele situado entre
a sede urbana do município de Altamira e a sua foz. Mas sabemos que basta uma
nova reunião deste conselho para que esta resolução seja alterada.
A oferta de milhões de reais aos kayapó, uma clara tentativa de
semear a desunião e enfraquecer a luta deste povo contra Belo Monte era a
preparação do terreno para as próximas barragens planejadas para o Xingu.
Dizendo tratar-se de linhas de projetos de seu setor de responsabilidade
social, sem qualquer relação com a obra em construção, a empresa conseguiu, num
primeiro momento, convencer os grupos kayapó do estado do Pará a aceitarem a
oferta, algo em torno de 18 milhões para serem gastos em projetos durante 4 anos.
As aldeias kayapó do Mato Grosso (Ti Kapoto Jarina), sob a
liderança de Raoni Metuktire e Megaron Txucarramãe, sempre negaram
enfaticamente este apoio, o que gerou conflitos com os grupos kayapó do Pará,
que a princípio aceitaram os recursos oferecidos. Entretanto, ontem, dia 5 de
março, caciques de 26 aldeias do Pará, predominantemente da margem leste do rio
do Xingu, representadas pela ‘Associação Floresta Protegida’ (AFP), resolveram
que também não vão aceitar mais nenhum recurso da Eletrobrás. A breve carta
encaminhada pelos indígenas diz:
“Senhores da Eletrobrás,
A palavra de vocês não vale nada. Acabou a conversa. Nós
mebengôkre/kayapó não queremos nem mais um real do dinheiro sujo de vocês. Não
aceitamos Belo Monte e nenhuma barragem no Xingu. Nosso rio não tem preço, os
peixes que comemos não tem preço, a alegria dos nossos netos não tem preço. Não
vamos parar de lutar, em Altamira, em Brasília, no Supremo Tribunal Federal. O
Xingu é nossa casa e vocês não são bem vindos.”
Para esta decisão pesaram seguidos descumprimentos dos acordos
estabelecidos pela Eletrobrás com os kayapó e, principalmente, a evidente
relação do apoio oferecido com as intenções do governo de aproveitar o
potencial hidroelétrico do rio Xingu.
Para os kayapó a palavra vale muito. A breve parceria entre a
Eletrobrás e AFP teve fim nos projetos ditos “emergenciais” executados em 2012,
no valor de R$ 1,5 milhão. Os projetos de médio-longo prazo, no valor de 4,5
milhões ao longo de 3 anos, foram recusados por todas as aldeias representadas
pela AFP, em um dia histórico de reuniões que culminaram em discursos efusivos
e emocionados dos caciques, exaltando o valor da cultura e do território
kayapó. Todos os caciques, sem exceção, quiseram falar: “nós não queremos esse
dinheiro, não precisamos dele”. Os caciques perceberam que a Eletrobrás e o
governo não têm palavra, e não se conversa nem se estabelece acordos com quem
não tem palavra. Recusando a parceria com a Eletrobrás os kayapó se fortalecem
na luta pela vida do rio Xingu.
Fonte: Movimento Xingu Vivo