Com colete à prova de balas, chacoalhando no banco
de trás da viatura da Força Nacional de Segurança, essa é a quarta vez que a
produtora e líder rural Nilcilene Miguel de Lima aponta lugares onde encontrou
corpos furados a bala nas estradas do sul de Lábrea, município do Amazonas. “Já
teve vez que não apareceu ninguém para buscar. O povo enterrou por aí mesmo”.
É fim de tarde. A viatura tem que chegar na casa
de Nilcilene antes do escurecer, onde dois policias passam a noite em vigília.
Alguns quilômetros antes do destino, ela se agita ao ver uma picape azul no
sentido oposto da estrada:
– É ele! É o carro do Pitbull.
‘Pitbull’ é o apelido de Vincente Horn, um dos
motivos para a proteção que recebe de nove homens da Força Nacional. Ele é um
dos autores da longa lista de ameaças contra a vida de Nilcilene, que já perdeu
a conta de quantas vezes foi jurada de morte pelos cães de guarda de grileiros
e madeireiros.
As ameaças começaram em 2009, quando ela assumiu a
presidência da associação Deus Proverá, criada pelos pequenos produtores do
assentamento para defender o grupo contra as invasões de terra e roubo de
árvores. No ano seguinte, depois de fazer denúncias e abaixo-assinados contra
os criminosos, Nilcilene foi espancada e teve sua casa queimada em um incêndio
anunciado. Em maio de 2011, foi obrigada a fugir enrolada em um lençol
para despistar o pistoleiro que estava de campana no seu portão. A equipe da
Força Nacional foi deslocada em outubro para garantir que a líder pudesse
voltar para casa e continuar denunciando os problemas da região.
Mesmo com a proteção ostensiva, as mãos de
Nilcilene tremem enquanto a picape azul se aproxima e o silêncio pesa dentro da
viatura. O policial na direção enrijece as costas, o copiloto engatilha seu
fuzil. A estrada de terra é estreita, obrigando os carros a passar a menos de
um metro de distância. Pitbull não se intimida. Ele reduz a velocidade, abre
sua janela e, com um largo sorriso no rosto, acena um tchau.
Enquanto os carros se afastam, Nilcilene aponta os
galões de gasolina que deslizam vazios na caçamba da picape:
– Essa noite a motosserra vai comer.
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Pública: